Mais uma história para vocês!
Pessoas Os Contos de Naral tem doze contos que já estão escritos e vou estar postando o primeiro conto que é Os Contos do Rei.
Espero que gostem de Naral e dos seus personagens!
Beijos!
Parte Primeira
Da Terra a Naral
O Castelo Branco brilhava na luz da
manhã. Erguido há três milênios, ele se destacava ficando acima da cidade em um
morro cercado por matas e jardins. Era feito de uma pedra branca encontrado em
uma pedreira perto da Floresta Velha e cem quilômetros dali.
Abaixo dele a cidade de Inay
despertava. Era uma grande cidade cercada por uma muralha de dez metros da
altura. As ruas eram calçadas com pedras escuras e havia redes de esgoto e para
escoar água da chuva. As casas eram coloridas e com jardineiras nas janelas.
Aquela era uma época de paz, mas há
novecentos anos a Segunda Grande Guerra assolava o reino.
As duas maiores famílias do reino de
Eyri estavam em guerra pelo poder de comandar o reino e pelas terras centrais
do país.
Naquela época o Grande Rei (título
dado ao governante de Eyri) era da família Delano e este procurou de todas as
formas acabar com as brigas entre eles e a família Kustas, mas havia política
demais entre eles e no final para salvar a vida de seu filho ele decidiu partir.
O Grande Rei rumou para o mundo do
exílio.
Pouco depois as coisas se acalmaram e
eles puderam ver o que tinham feito. Milhares de mortos e sua linda terra
virando um pântano de sangue.
Os últimos lideras das casas Delano e
Kustas, jovens cheios de ideais que haviam assumido o comando com a morte dos
antigos lideres decidiram que iam por um fim nos conflitos.
Um pacto foi assinado não só pelas
duas casas, mas também pelas outras cinco famílias de Eyri. Nesse pacto o país
ficava entregue a um regente eleito pelas famílias até que o herdeiro voltasse
do exílio.
O Livro das Trevas, um objeto mágico
de grande poder, foi enviado ao mundo do exílio para que procurasse o herdeiro
Delano.
Na época que a nossa história começa
alguém dentro do Castelo Branco reclamava da demora desse herdeiro aparecer.
— Quanto tempo isso vai demorar? –
Crhist perguntou em tom petulante.
Crhist Kustas-Delano era ainda um
adolescente que havia galgado o posto de cavaleiro por mérito. Ele tinha
consciência do seu poder e isso o tornava arrogante e de expressão altiva e
fechada. Sua aparência chamava a atenção de homens e mulheres onde quer que ele
fosse. Descendente de estrons do norte seu cabelo era branco e liso e descia
por suas costas indo até a cintura, o rosto de maçãs salientes era levemente
moreno como se passasse muitas horas ao ar livre e seus olhos amendoados eram
azuis muito claros, quase prateados. Seu corpo era magro e esguio não mostrando
a força que tinha.
— O tempo necessário – respondeu o
outro ocupante da sala.
Ismail Kustas era irmão mais velho de
Crhist. Eles tinham a mesma mãe, mas pais diferentes. Ele era alto e imponente
com olhos dourados frios e faziam tremer amigos e inimigos. Os cabelos
castanhos caiam pela testa, mas ao contrario do irmão os dele eram curtos
chegando à gola da roupa que lembrava uma farda militar. Como chefe de defesa
do reino seu bom senso havia salvado Eyri mais de uma vez.
— Os dois sem discussão – disse uma
terceira voz de modo suave, quase cantado, mas fora o suficiente para fazer o
forte Ismail estremecer e o belo Crhist ficar vermelho.
Ausna Kustas era a regente daquela
terra. Era uma mulher de grande beleza, com cabelos negros que formavam belos
cachos que iam até o meio das cochas, os olhos dourados eram iluminados como se
ela tivesse uma luz interior, seu corpo bem feito era mostrado no uniforme
militar que usava com desenvoltura e arrogância.
— Mãe não estamos brigando –
apressou-se em dizer Ismail.
— Não? – ela levantou uma sobrancelha
bem desenhada fazendo o filho mais velho encolher-se e depois se voltou para o
caçula que quase deu um pulo – Crhist Tranfos Kustas-Delano...
— Mãe! – Crhist ficou visivelmente
contrariado – Não use o meu nome inteiro.
— Por quê? Seu nome é muito bonito.
— Tranfos é um nome tão comum ao lado
do grandioso nome Delano – resmungou ele sentando no sofá e cruzando as pernas.
— Sempre tão orgulhoso – ela disse com
carinho virando-se para a sala onde estavam.
Era um escritório pequeno com sofás,
uma escrivaninha, um armário onde Ismail guardava seus documentos. Nas paredes havia
alguns quadros mostrando paisagens onde cavalos selvagens trotavam pelos
campos. A única coisa que quebrava a decoração espartana era um vaso em cima de
uma pequena mesa de conto contendo flores vermelhas que Crhist dava ao irmão
todos os dias de manhã. Em Eyri davam-se flores aos amigos e parentes como
forma de amor, respeito e devoção.
— Você é tão pratico Ismail e seu
irmão ainda lhe dá flores – ela olhou os filhos com carinho – Tenho orgulho de
vocês.
— Tudo bem mãe? – Crhist perguntou
preocupado – Você não costuma nos elogiar...
— É mesmo! – ela voltou a rir agora
uma risada sem alegria – Eu, Ausna Kustas, deveria prestar mais atenção à minha
família.
— O que houve mãe? – Ismail parecia alarmado
com o modo que ela estava agindo.
— Drima me contou que o Livro das
Trevas desapareceu indo rumo ao mundo do exílio.
— Acha que... – Ismail não completou a
frase.
— Se ele achar o herdeiro Delano muito
de nossa vida vai mudar.
— Bem você vai deixar de ser regente
para ser a nossa mãe – disse Crhist que sempre tivera uma mãe muito ausente na
sua vida.
— Não é só isso Crhist – Ismail
parecia entender a dimensão do problema – Com um novo rei novas ordens que
podem mudar todo o nosso país e a nós. Você é cavaleiro do reino e eu como
chefe de segurança teremos que obedecer a ele.
Ouviram uma pequena batida na porta e
esta se abriu mostrando a entrada de três pessoas.
— Tomei a liberdade de chamar aqueles
quem eu mais confio para falarmos sobre o desaparecimento do livro – disse
Ausna.
Valhalla Feten era uma jovem mulher do
povo da Floresta Velha. Alta, seus cabelos negros e lisos iam até a cintura e
seus olhos castanhos eram frios. Secretaria de Ausna ela jurara devotar a vida
a regente depois que está salvou a vida de Valhalla uma vez. Era uma esgrimista
de grande talento e uma lutadora sagaz.
Sipria O’Nara era a governanta do
Castelo Branco e cuidava de todos que viviam ali, da regente ao cavalariço.
Deveria ter a idade de Ausna, mas como todo eyriano não mostrava a idade que
tinha. Seu cabelo castanho encaracolado era curto e ela só vestia vestidos
simples e brancos. Descendente dos O’Nara das montanhas ela fora uma lutadora
feroz que encontrara paz junto a Ausna.
O ultimo era Dator Landro, filho do
meio de Ausna. Era um militar quieto, de cabelos castanhos claros, olhos azuis
escuros. Na aparência ele lembrava Ausna, mas tinha um sorriso fácil. Era justo
e bem humorado e isso havia lavado-o a ter muitos seguidores nas tropas.
Dator tivera uma grave briga com a
família, mas quando a sua mãe sofrera um atentado ele voltara para ser
guarda-costas dela.
Ismail o encarava com o rosto livre de
expressão, mas Crhist não escondia que desprezava o irmão do meio.
Dator foi para o fundo da sala e ficou
em pé, recostado na parede numa postura relaxada e de olhos fechados como se
estivesse alheio a tudo em volta, mas quem o conhecesse sabia que ele estava
bem alerta.
— Eu não vou admitir isso! – Valhalla
bateu a mão na escrivaninha coberta de papéis de Ismail.
— Valhalla! – disse Ausna com a sua
perigosa voz calma – Fique calma e sente-se!
— Uma Feten da Floresta Velha não vai
servir um estrangeiro! – ela era a única que não baixava a cabeça para Ausna.
— Até mesmo os Feten juraram pela sua
honra defender o herdeiro – disse Dator sem mudar sua postura.
Valhalla bufou para ele, mas Ismail
perdeu a paciência.
— Chega! – nesse momento ele parecia
tanto com Ausna que a Valhalla sentou amuada e a regente começou a rir.
— Ismail ficou autoritário – disse Crhist
em tom de gozação.
— Vocês... – Ismail despenteou os
cabelos de frustração – Quando o livro trouxer ele as sete famílias serão
chamadas para legitimar o herdeiro, mas isso vai ser apenas praxe, pois a
palavra definitiva sempre é do Livro das Trevas e não vai ser os resmungos de
uma Feten que vai mudar isso! Não adianta ficarmos aqui discutindo isso. Minha
casa jurou a novecentos anos que ia apoiar o herdeiro quando ele aparecesse e é
isso que vou fazer.
— Acho que essa é a ultima palavra e a
palavra certa – Ausna colocou a mão no ombro do filho mais velho sentado atrás
da mesa.
— Meu juramento não será mudado –
disse Sipria em tom calmo.
— Sou cavaleiro – Crhist olhou pela
janela – Jurei pelo reino e é pelo reino que vou lutar.
Valhalla ergueu o queixo em sua
teimosia. Ausna foi até a sua amiga e seu braço com carinho.
— Você não precisa jurar devoção a
ele, mas nos ajude com os tempos difíceis que viram.
A expressão carrancuda da moça da
floresta se desfez e ela segurou a mão da regente com carinho.
— Minha devoção é apenas a você,
Regente Ausna.
— Bem – Sipria pigarreou – Se já
entramos em um acordo vou ver como anda o jantar.
— Não! – Crhist olhava Dator – Ele não
disse de que lado vai ficar!
— Pelo amor dos deuses Crhist! –
Ismail parecia contrariado – Dator é oficial do exercito...
— Eu não quebro juramentos Crhist –
respondeu Dator ficando reto e lançando um olhar frio para o garoto.
— Você só esquece que tem família, não
é?
— Chega disso! – Ausna levantou a voz
e isso fez com que todos se encolhessem – Não quero mais nem uma palavra sobre
isso Crhist! Ouviu?
— Sim minha mãe.
Davi olhou as pilhas de livros que
haviam se acumulado na biblioteca. Seu pai era fanático leitor, mas quanto à
organização era de dar medo. Sua mãe sempre dizia que era melhor não mexer
muito na bagunça do seu pai ou ele nunca mais ia achar nada, mas Davi havia se
prontificado a ajudar a arrumar e catalogar os livros. Infelizmente ele não
tinha ideia nem mesmo de como ia se movimentar dentro da biblioteca, quanto
mais chegar até suas prateleiras para arrumar.
Era um cômodo retangular que
antigamente era uma sala na parte superior da casa. Seu pai mandara colocar
prateleiras nas paredes, mas como o passar do tempo sua coleção crescera tanto
que ele tivera que mandar construir outras prateleiras. Haviam três poltronas
perto de duas grandes janelas que exibiam vitrais coloridos, uma grande mesa de
madeira escura com cadeiras estofadas. Tudo poderia parecer até aconchegante se
não fosse pelas imensas pilhas de livros que haviam no chão.
— Boa sorte – disse Paulo, seu irmão
mais velho, passado pela porta da biblioteca e o vendo parado ali estático.
— Você vai precisar – disse Rafael,
seu irmão do meio, ao passar pela porta.
— Vocês estão se divertindo, não é? –
gritou ele raivoso para os dois que desciam as escadas rindo – Saco!
— Eu ouvi isso Davi Roberto Carlos! –
sua mãe gritou do alto da escada e entrou na biblioteca com as mãos na cintura
– Xingar é vulgar e eu não quero isso na boca dos meus filhos!
Isabel Maria era uma mulher de corpo
magro e baixa estatura, mas quando ficava brava seus filhos diziam que ela
podia ficar do tamanho de uma montanha. Os olhos negros brilhavam como se
apenas estar viva fosse algo para se comemorar e os cabelos castanhos costumavam
ficarem presos em um coque. Apesar de seus trinta e oito anos a idade não
aparecia em seu rosto de adolescente e ninguém podia dizer que ela tinha três
filhos, sendo que dois deles já na faculdade.
— Pelo amor de Deus mãe! – Davi ficou
vermelho – Meu nome é Davi! Esqueça esse Roberto Carlos!
— Por quê? Roberto Carlos é o meu
cantor favorito e eu sempre quis que você se tornasse um.
— Eu?! – esse sonho não podia estar
mais distante de Davi, pois ele cantando era pior que gato no cio.
— Ai! – ela olhou para a biblioteca
inclinando a cabeça – Seu pai é tão organizado no trabalho, mas aqui em casa...
– ela lançou um olhar incisivo para o filho como se dissesse que ele também não
era um exemplo de arrumação.
Davi tinha quinze anos e era de
estatura mediana, enquanto seus irmãos na sua idade eram bem mais altos. Seus
cabelos eram de um louro dourado levemente encaracolado com uma franja que caia
pela testa. Os olhos eram verdes, mas de um verde escuro da cor dos olhos do
pai. Era o único que havia puxado a ele tanto nos olhos quanto na cor de
cabelo.
Apaixonado por futebol ele participava
de um time misto em um clube e havia simplesmente coberto todas as paredes do
seu quarto com pôsteres de jogadores de vários times.
— Bem – Isabel se virou para a porta
da biblioteca – Boa sorte!
— Você também mãe?!
Davi fechou a porta em uma tentativa
de se afastar das gozações da sua família e passou às três horas seguintes
retirando livros das prateleiras e formando pilhas imensas no chão, nas mesas e
nas poltronas.
— Almoço! – disse a sua mãe abrindo a
porta, mas ela parou de chofre ao se deparar com pilhas de livros quase da sua
altura – Davi, você não ia arrumar?
— Primeiro eu preciso limpar – disse o
menino saindo de detrás de uma pilha coberto de poeira.
Isabel Maria não se conteve e começou
a rir.
— Você é um cabeça dura – ela
desarrumou os seus cabelos já em total desalinho – Se precisava de ajuda era só
falar.
— Vou pedir ajuda para aqueles dois?!
– ele bateu a poeira da roupa – Nem em outro mundo.
— E ai? – seu pai havia parado na
porta da biblioteca sorrindo – Como estamos?
Seu pai já passara dos cinqüenta anos,
mas era impossível dar essa idade a ele. Era alto como os seus irmãos, os
cabelos loiros eram parecidos com os do filho caçula assim como os olhos verdes
que olhavam o mundo com certa melancolia como se tivesse perdido algo.
— Sujo – resmungou Davi saindo da
biblioteca – Vou me lavar.
— Eu tenho tantos livros assim? –
Lucas olhou admirado as pilhas de livros.
— Você gosta de viajar, não é? –
Isabel olhou com carinho para o marido que, de repente ficou serio como se
pensasse em algo há muito esquecido, mas logo mudou para uma expressão alegre.
— E ai o que temos para o almoço?
— Você vai adorar meu bem. Fiz
bacalhau.
— Você sabe do que eu gosto, não é
querida?
O almoço de sábado na casa dos Delácio
era um acontecimento festivo. Como cada um tinha seus compromissos nos dias de
semana eles pouco se viam, assim usavam o sábado para colocar os assuntos da
semana em dia.
— Como vai indo a faculdade? –
perguntou Lucas para os dois filhos mais velhos.
— Já estou de férias – disse Paulo de
modo arrogante.
Paulo tinha vinte anos e estava no
ultimo ano de direito. Era um rapaz bonito e inteligente que trabalhava em uma grande
firma há dois anos.
— Claro, o supergênio – resmungou
Rafael, o filho do meio.
Rafael tinha dois metros da altura e
jogava no time de basquete da cidade. Não sendo muito fã de estudos, fora com
muita dificuldade que entrara na faculdade de educação física, mas estava indo
bem.
Davi estava pensado nas montanhas de
livros que ainda tinha para arrumar até perceber que estavam falando com ele.
— Presta atenção “rapa do tacho” –
Rafael deu-lhe um cutucão doloroso nas costelas.
— Ai! Isso dói Rafael!
— Sem brigas na mesa – repreendeu
Isabel servindo o peixe para todo mundo – Seu pai estava perguntando como andam
as suas notas Davi.
— Razoáveis – resmungou ele colocando
uma garfada de batatas na boca. Porque aquele negócio de notas tinha que ser
discutido?
— Como sempre, não é “pequinês”?
— Você é um chato Paulo! – Davi tinha
outro nome na cabeça, mas preferia ser comido vivo por algo bem asqueroso a
dizer em voz alta a falar na frente da sua mãe.
— Não implique com a altura do seu
irmão – disse Isabel olhando risonha para o filho mais novo que sumia entre os
irmãos mais velhos – Ele ainda tem muito que crescer.
— Ora – Rafael lançou um olhar gaiato
para Davi que teve vontade de chutá-lo por baixo da mesa – Acho que ele puxou à
senhora, não é mãe? – com isso ele despenteou os cabelos do outro que lançou um
olhar assassino.
— Mas seu pai sempre diz que as
baixinhas são as melhores, não é querido?
— Você tem toda a razão querida.
Os três irmãos ficaram constrangidos
com a troca de olhares apaixonados do casal. Eles não conheciam casal mais
apaixonado, mesmo depois de tantos anos de casamento.
— Mas acho que Davi acabou puxando a
mim – olhou com carinho para o caçula que se parecia tanto com ele fora à
altura.
— Tenho serviço para acabar – disse
Davi fugindo da mesa.
— Covarde – disse Rafael rindo.
— Davi você não terminou o seu almoça!
– gritou a sua mãe enquanto ele subia as escadas correndo.
— Boa sorte – ele pode ouvir o seu pai
dizendo lá da cozinha antes de fechar a porta da biblioteca e dar um suspiro de
alivio.
— Mas que família!
Definitivamente ele ia acabar com
aquilo e passar as férias bem longe de casa. Se tivesse que suportar seus
irmãos novamente ia surtar.
Voltou a limpar as prateleiras, mas de
repente algo grande e duro caiu na sua cabeça fazendo cambalear e xingar – que
a sua mãe não o ouvisse.
— Foda!
Um grande livro com capa preta havia
caído do alto da prateleira.
— De onde você veio? – ele pegou o
livro pronto para jogá-lo na pilha mais próxima quando viu a capa.
Nela havia um grande dragão em cima de
uma montanha nevada. A imagem brilhava em vermelho, azul e branco quase a ponto
de parecer real, como se cada cor fosse fluida e dançasse pela capa.
O nome estava em letras góticas:
OS CONTOS DE NARAL
Curioso ele abriu o livro, mas para o
seu desapontamento ele estava em branco a não ser por uma frase na primeira
capa:
Os Contos do Rei
— Que coisa idi... – ele não pode
completar a frase, o mundo todo pareceu explodir ao seu redor e ele não viu
mais nada.
~~***~~
Os jardins do Castelo Branco eram
conhecidos em toda Eyri por sua beleza e diversidade. Cada regente havia
acrescentado algo e ele nos anos após a guerra, já que ele ficara destruído
naquela época.
Os jardins cercavam todo o castelo e
tinham como centro uma fonte de pedra negra em formato de uma grande arvore de
onde caia água cristalina em uma grande bacia de pedra. Havia bancos de madeira
por todo o lado para que as pessoas pudessem parar e apreciar a vista.
As flores eram de todos os tamanhos e
formatos, assim como os arbustos floridos que emprestava um cheiro maravilhoso
no ar. Caramanchões por onde rosas vermelhas como sangue subiam ficavam perto
da fonte e era o local favorito de Ausna.
Ela passeava sempre durante a manhã
ali e naquele dia ela estava com Valhalla que não parava de falar sobre o repasse
de verbas para as tropas.
— A senhora percebeu o quanto estamos
gastando com a força militar em plena época de paz? A cidade de Níria esta
precisando de uma ponta há dois anos.
— Sei disso Valhalla, mas você já
percebeu o quanto as nossas fronteiras são problemáticas? Como as invasões, os
saques e as mortes tem aumentado entre nós e Entrani? Ladrões infestam as
estradas e rumam para vilas desprotegidas – olhou para o céu azul – Às vezes
parece que tudo vai fugir do nosso controle.
— Ausna...
— Estou ficando cansada Valhalla.
Dediquei minha vida e sacrifiquei a minha vida ao reino e o que ganhei com
isso? – olhou para as moitas de flores sabendo que Dator estava ali cuidando
dela de modo discreto e sem ser visto – Eu não posso nem posso ir aos jardins sem
que meu filho me acompanhe para impedir que algum me ataque – ela deu um
suspiro – Às vezes parece que tudo vai escapar ao nosso controle.
Valhalla ia dizer algo quando o ar
crepitou e Dator apareceu do nada correndo para elas, mas Valhalla já havia
jogado a regente no chão. Houve uma explosão em um dos canteiros de flores e o
ar se encheu de fumaça e pétalas de flores.
— Mas que diabos!... – Ismail descia
as escadas do castelo com uma espada na mão.
Guardas começaram a surgir por todo o
lado.
— Estou bem Valhalla – Ausna empurrou
a amiga para o lado vendo o caos à sua volta – Fiquem calmos droga! – ela
gritou – É o Livro das Trevas.
Ausna conhecia bem as entradas
teatrais do livro para perceber que era ele fazendo.
Os soldados pararam no meio dos
jardins e começaram a rir. Valhalla e Ismail xingaram enquanto Dator recolocava
calmamente a espada na bainha. O ar estava cheio de pétalas voando.
Todos se aproximaram do canteiro de
flores na cor roxa onde houvera a explosão e ficaram pasmos ao ver um garoto
ali, uma garoto vestido de modo muito estranho com os cabelos loiros e... olhos
verdes!
— Mas que diabos me aconteceu?! – Davi
tentava tirar as pétalas de flores do cabelo e do rosto. Ergueu o rosto e só
então percebeu o local onde estava – Mas que...
— Será esse...? – Valhalla olhou para
ele pasma.
— O herdeiro Delano – disse Ismail com
a voz desprovida de emoção.
Davi olhava tudo à sua volta de modo
pasmo. Estava em um jardim como ele nunca havia visto, com um grande castelo ao
fundo e com pessoas vestidas como se estivessem na era feudal.
Ao verem os olhos verdes de Davi todos
perceberam que estavam diante de um Delano da antiga estirpe e que ele só podia
ser o herdeiro do trono, o Grande Rei.
— Majestade – Ausna se inclinou assim
como Valhalla e Ismail, enquanto os soldados se ajoelhavam perante o seu rei e
novo comandante.
O menino olhava aquilo imaginando que
tipo de sonho idiota era aquele. Será que dormira enquanto lia um livro e agora
sonhava com seu enredo? Mas era tudo tão real, mas a gente pode ter sonhos
reais não é mesmo? Todavia era real demais já que ele podia sentir o ar frio da
manhã e a terra úmida debaixo dele.
— Alteza, eu sou Ausna Kustas, a
regente. Esses são Ismail Kustas chefe da defesa do reino, Dator Landro capitão
da guarda, ambos meus filhos e Valhalla Feten da Floresta Velha.
Alteza?? Com quem ela estava falando?
Davi observou aquelas pessoas vendo
sua beleza dos soldados a tal Ausna que o deixava hipnotizado com sua cascata
de cabelos negros brilhantes.
— Ele está confuso – disse Dator
estendendo a mão para Davi – Eu ti ajudo.
— Obrigado – disse o garoto aceitando
a mão, mas parou estático ao ver que tinha falado naquela estranha língua
melodiosa que os outros falavam.
— Parece que o Livro das Trevas usou o
principio da incerteza para ensinar nossa língua a ele – disse Ismail olhando
para Davi.
— Principio do quê?
— O principio de que alguém que venha
para esse mundo não fale a nossa língua – disse Dator de modo calmo – Assim a
nossa língua é ensinada de modo mágico.
— Mundo? Magia? – agora ele tinha
certeza que estava sonhando.
Ele não podia estar em outro mundo e
ainda por cima em um mundo mágico, se existiam outros mundos eles deviam ser
cheios de naves espaciais e robôs.
— Olhem! – um dos soldados apontava
para o alto onde o Livro das Trevas girava lentamente bem acima do lugar onde
ele estivera sentado.
— Sua porcaria – Valhalla resmungava –
Podia ter feito isso sem tanto barulho.
— Tenha mais respeito – disse Ismail
aborrecido.
— Tcha! – a moça virou o rosto
contrariada.
De repente o livro brilhou
intensamente e quando perceberam havia um grande dragão vermelho pisoteando as
plantas.
Pálido Davi deu um pulo para trás e
Dator segurou o seu ombro sorrindo para ele.
— Está tudo bem. Aquele é o guardião
do livro e não um dragão de verdade.
— Não?! Pra mim ele é bem real!
— Os meus jardins! – uma moça vestida
da branco saiu correndo co castelo carregando uma grande colher das pau – Saia
daí!
O dragão rugiu para ela, mas a moça
apenas colocou as mãos na cintura.
— Saia logo daí ou vou queimar uma a
uma das suas folhas!
O dragão pareceu murchar e saiu
bamboleando do meio das flores para o caminho ladrilhado de pedras brancas.
— Seja bem vindo rei Davi Delano –
disse o dragão fazendo Davi estremecer – Há novecentos anos eu espero pelo seu
nascimento e agora que o seu poder está para vir à tona é chegada a hora de se
apresentar ao reino de Eyri.
— Que tipo de sonho é esse? – gemeu Davi.
— Você sabe que não é sonho rei Delano
– disse o dragão calmamente – Quando o trouxe da Terra não lhe dei apenas o dom
de entender e falar a língua de Eyri, mas também dei-lhe um pouco do
conhecimento desse mundo. Pense um pouco e vai se lembrar.
Davi estava até com medo de pensar,
mas como nunca paramos de pensar de repente veio a sua mente um cabedal de
informações grande cheio de historias de guerra e de sete famílias em luta em
uma terra chamada Eyri, no mundo de Naral. Ele também se lembrou da guerra há
novecentos anos quando o Grande Rei foi para o exílio para salvar o filho e que
ele era descendente desse rei.
— Isso é impossível! Não pode ser
real!
— Tudo é bem real rei Delano. Esse país
esteve esperando o seu rei por tempo demais, por favor, não o deixe esperando
mais e assim ele cair no caos.
Davi olhou para os olhos vermelhos do
dragão e sentiu que seu mundo anterior se afastava e aquele mundo onde ele
estava se transformava no mundo real. Ali ele ia ser de um mundo mágico onde a discórdia
imperava.
O grande dragão desapareceu e por
alguns segundos o livro ficou ali girando lentamente até também desaparecer.
— Espere! – Davi correu para ele –
Como é que eu volto para casa?
— Alteza – Ausna foi até ele com uma expressão
estranha – O Livro das Trevas é um objeto de grande poder mágico, mas é um
objeto de vontade própria. Não sabemos aonde ele vai quando não está em Eyri.
— Mas... – ele olhou com desespero para
a antiga regente – E a minha família? O que vão pensar do meu desaparecimento?
— Essa é uma pergunta que não tenho
resposta – Ausna apertou seus ombros carinhosamente – Mas se houver algo que eu
possa fazer pelo senhor pode ter certeza que faremos Grande Rei. Nosso reino só
quer a sua felicidade; há ainda muitos poderes por ai que não conhecemos. Talvez
um deles seja útil ao senhor.
— Obrigado – Davi sentia uma grande
vontade de chorar, mas as palavras de Ausna e o rosto bondoso de Dator o acalmou
quem sabe tudo ficasse bem.
— Vamos entrar – resmungou Ismail.
Toda a seriedade daquele homem o
deixava intimidado. Ele não dava um sorriso e seu rosto parecia uma carranca
perpétua.
Davi nunca havia visto um castelo como
aquele, na bem da verdade ele nunca havia visto castelo nem fora os das telas
do cinema e das imagens nos livros, mas ele imaginou que nem um podia ser mais magnífico
que o Castelo Branco.
Logo na entrada havia uma grande sala
com sofás de veludo perto da grande lareira, aliais haviam três lareiras ali, o
que, para Davi, filho de um país tropical, era estranho. Tinha também uma mesa
de dez lugares em um canto e pequenas mesas por todo o lado. O chão era cheio
de tapetes grossos e bem limpos e as paredes decoradas com quadros de
paisagens. Uma grande escadaria de mármore rosa subia para os andares
superiores.
Depois vinham pátios com pequenos
jardins, mais salas e saletas e corredores que pareciam ir por quilômetros.
A noticia de que o rei chegara correra
o castelo e as pessoas se acumulavam nos corredores laterais e murmuravam ao se
ajoelhar.
— Por minha devoção.
— O que está acontecendo? – perguntou Davi
para Ausna ao se verem em outro corredor, mas agora estavam apenas eles e
alguns guardas.
— O que eles fazem é um juramento rei
Davi. Quer dizer que cada um deles morreria por você com felicidade.
— O que?! – ele parou assustado e
retrucou com a voz um pouco aguda – Eu não quero que ninguém morra por mim!
— É um estrangeiro mesmo – suspirou Ismail.
— Você faz a palavra estrangeiro soar
como uma ofensa – resmungou Davi para o carrancudo Ismail.
— Tenha paciência Ismail – disse Dator
fechando a cara para o irmão – Ele não sabe como são as coisas em Eyri.
— Isso vai ser muito complicado! O país
esta enfrentando levantes por todo lado e temos que ensinar a ele coisa básicas
como um juramento de fidelidade.
— Ismail! – Ausna chamou a atenção do
filho – Um rei não se faz da noite para o dia, assim sua alteza só vai
conseguir governar com a nossa ajuda.
— Então o Grande Rei chegou – disse uma
voz melodiosa.
Alguém havia saído de uma das salas e
foi para perto deles.
Por um momento Davi acreditou que
estava diante da mais bela mulher que ele já vira, mas logo percebeu o seu
engano. Era um garoto de longos cabelos brancos e olhos azuis quase translúcidos.
— Meu rei – disse Ausna – Esse é meu
filho caçula Crhist Kustas-Delano.
Davi ainda estava estático com o
garoto, mas agora era mais de raiva do modo arrogante como ele o olhava como se
fosse superior a ele.
Naquele momento Davi Delano, Grande
Rei de Eyri, percebeu que não ia se dar bem com o arrogante garoto.