MAJIC
Por tras da bruma existe mais do que os olhos podem ver.
Capitulo I
Sara olhou
pela janela do oitavo andar desfrutando dos últimos momentos de paz antes das
aulas começarem no outro dia, as crianças e adolescentes iam começar a chegar
naquele dia e o silencio ia ser preenchido com gritos e correrias pelos pátios
e jardins.
— Sonhando
Sara? – perguntou Rafael sentando do lado dela com uma xícara de café.
— Pensando que
logo, logo isso aqui vai estar naquele tumulto básico.
— Verdade –
disse ele também olhando pela janela – Estava ficando cansado dessa calmaria.
— E eu
preocupada com o tumulto pelos próximo seis meses...
Uma batida na
porta chamou a atenção dos dois e um homem entrou esbaforido.
— Diretor um
barco brasileiro foi encontrado destroçado na Bahia das Eras!
— Um barco?! –
Rafael quase engasgou com o café – Como isso é possível?
— A única
possibilidade é que haja um escolhido a bordo – disse Sara – A ilha deve ter
percebido isso e franqueou a entrada.
— Há
sobreviventes? – perguntou o diretor Rafael.
— Não sabemos
disse o homem - há energia demais circulando em toda a volta. Precisamos de um
demago.
— Eu irei –
disse Rafael – Sara chame Marc e diga para nos encontrar na bahia.
Rafael saiu
correndo e subiu em uma caminhoneta usada em terrenos difíceis e acelerou para
a estrada de chão que ia rumo a parte leste da ilha.
A estrada de
terra batida corria por entre matas de pinheiros e carvalhos, pomares, fazendas
e matas que brilhavam coloridas naquela manhã de segunda. Entrou em uma parte
asfaltada da estrada que passava pela vila com suas casa coloridas e cafés com
mesas nas caçadas.
Depois de
alguns quilômetros a estrada voltou a ser de chão e começava a descer rumo ao
mar. A estrada passava por serras e paredões de pedra até que se avistava o mar
de um azul profundo e ao longe uma estranha névoa que envolvia a ilha como um
grande anel. Ele parou o veículo perto de um amontoado de pedras do tamanho de
casas que pareciam brotar da areia branca. Entre elas havia uma trilha que
serpenteava por rochas e paredões. Rafael entrou por ela correndo e saiu em uma
praia em forma de meia lua que ficava entre pedras. A entrada da praia era
estreita e entre as pedras e a areia havia um iate semi destruído. Um grande
rombo ia da popa a proa do navio como se alguém tivesse aberto com uma faca
gigantesca o casco. Ele estava praticamente partido ao meio e em volta dele
havia destroços trazido pelas ondas, havia também uma estranha névoa vermelha
cobrindo o barco como um manto.
— Parece
impossível que alguém tenha sobrevivido – disse um homem que estava observando
o barco.
Era um homem
alto, de pele curtida pelo sol, com longos cabelos loiros presos num rabo de
cavalo. Deveria ter uns trinta anos e os músculos apareciam na camiseta regata
que usava.
— Bom dia
Michael – disse Rafael sem tirar os olhos do barco – Isso é escudo de sereia,
acha que elas protegeram o barco?
— Só pode ser.
Elas normalmente teriam prazer em destroçar o barco, mas não fazem isso se
houver crianças a bordo.
— Vamos ver –
disse ele erguendo a mão apontando a palma para os destroços.
Os olhos do
diretor brilharam numa estranha luz e ele murmurou uma palavra em voz baixa. A
névoa vermelha rodopiou e correu para a palma da mão de Rafael que brilhava
intensamente até que nada mais restasse da névoa.
— Acha que
vamos conseguir subir a bordo Michael?
— A estrutura
está instável – resmungou ele olhando o barco de lado – O risco só vai valer a
pena se tiver alguém vivo a bordo.
— A única
maneira de saber é darmos uma olhada a bordo.
Ambos conseguiram subir para o destroçado
convés onde o corpo de um homem estava preso entre tabuas e cordas. A cabeça
quase decepada pendia balançando ao sabor das ondas que batiam no casco.
Rafael, que
era católico devoto, fez o sinal da cruz enquanto olhava envolta. Acharam a
escada e desceram para os camarotes, banheiros e cozinha. Enquanto andavam o
barco gemia dolorosamente como um animal ferido no estertor da morte. Acharam
dois corpos de mulheres mortas num camarote.
— Olhe –
Michael ergueu o braço de uma delas mostrando dois furos.
— Vampiros!
Eles não podem estar perto da ilha ou os alarmes soariam.
— Pra que
tanto espetáculo? Por mais idiotas que eles sejam costumam ser discretos ou
sabem que seu próprio conselho os transformaria em merda. Tem algo de
podre nesta história.
— Bem vamos
deixar Marc investigar já que pelo visto não há sobreviventes.
— Tem algo
mais Rafael aqui, as sereias não iam gastar seu poder a toa.
— Onde? Já
olhamos tudo!
— A casa das
máquinas.
Rafael estava
em dúvida que algo pudesse sobreviver em meio a toda aquela destruição mesmo
assim rumaram para a casa das máquinas descendo a escada de ferro que estava
torcida. A porta pendia das dobradiças e ao olharem para dentro perceberam que
seria impossível alguém sobreviver ali. Dava para ver o lado de fora pelo rombo
no casco e as máquinas pareciam ter se deslocado para a direita sendo
arrancadas do chão por alguma força descomunal. Estranhamente ali havia também
a névoa vermelha que vinha de debaixo de uma turbina.
— Mais escudos
de proteção – disse Michael.
— Talvez tenha
alguém vivo embaixo dessa coisa – resmungou Rafael se abaixando para olhar por
baixo da turbina – O problema é como vamos tira-los sem o barco sem ele se
desmanchar.
— Posso erguer
a turbina por alguns minutos e você tenta tira-los, mas se algo acontecer você
sai debaixo imediatamente.
— Certo, vamos
tentar.
Michael
apontou a palma da mão para a turbina murmurando uma única palavra e a mão dele
começou a brilhar intensamente assim como a estrutura inteira. De repente o
pedaço de aço retorcido que já fora uma grande turbina rangeu e começou a se
mexer e subir lentamente. Suor começou a se formar na testa do rapaz loiro que
ofegou com o peso.
Rafael deitou
e rastejou por baixo olhando em volta e arregalando os olhos ao ver duas
pessoas ali.
— Achei! –
gritou ele.
— Rápido!
Sabendo que
não tinha mais tempo ele segurou os braços e começou a arrastar. Com um safanão
puxou eles para fora antes que Michael não suportasse mais e deixasse a
estrutura cair.
— Deus – gemeu
o loiro caindo de joelhos.
— Você está
bem?
— Só estou um
pouco tonto.
Rafael desviou
os olhos para as pessoas que resgatara. Um era um homem de cabelos castanhos
dourados e curtos, a pele era branca com sardas por todo o rosto, deveria ter
mais de trinta e cinco, mas seu rosto era jovem e bonito. O outro era um
garoto, de cabelos loiro escuro, o rosto parecido com o do outro mostrando o
parentesco próximo, mas de pele mais morena e longos cílios cor mel. O menino
deveria ter em torno de treze anos de corpo magro.
Os dois
ostentavam cortes e ferimentos por todo o corpo e Rafael ficou preocupado com
ferimentos internos.
O barco rangeu
e começou a adernar.
— Precisamos
sair daqui – disse Michael se levantando – Eu levo o homem e você o garoto.
Casa um pegou
sua carga e rapidamente começaram a sair da sala de máquinas. No corredor o
barco rangeu e virou jogando eles contra a parede. Arrastaram-se com
dificuldade até o convés e praticamente pularam pela amurada antes que o barco
tombasse a afundasse parcialmente na água que felizmente não era muito funda.
— Ufa! –
Rafael respirou fundo aliviado.
— Precisamos
leva-los ao hospital – disse Michael olhando detidamente o homem – Eles parecem
bem feridos.
— Estou com a
caminhoneta aqui perto, vamos!
O ar frio
parecia congelar a cada respiração e Ian bateu os pés no chão tentando
esquentar enquanto olhava para o mar a procura do barco.
— Ta frio –
resmungou sua irmã esfregando os braços – Ian to com frio.
— Vem cá – ele
abraçou a irmã caçula tentando dar a ela algum calor a menina de dez anos.
Karol era
pequena, de longos cabelos castanhos e olhos negros. Era uma menina quieta, que
gostava de ficar desenhando e era muito ligada ao irmão mais velho. Ian tinha
quinze anos, era alto de cabelos negros e olhos castanhos cor de mel, era alto
e sempre muito sério. Era um dos melhores alunos da escola e era alguém avesso
a erros.
— Viemos muito
cedo, mano?
— Não, o barco
estará aqui em alguns minutos.
— Queria que a
mamãe e o papai estivessem aqui.
Ian não
respondeu. Para ele seus pais não faziam falta. Não passavam de dois estranhos
que nunca tiveram um só gesto de carinho com ele ou com a irmã. Ter filhos para
eles era apenas uma forma de mostrar a sociedade a visão de família feliz, um
quadro falso em todos os detalhes.
De repente um
barco se aproximou do atracadouro quase como se tivesse se materializado no ar.
Era uma lancha de dois andares, branca com o nome “Bruma” escrito no casco em
letras negras.
— Que lugar
gelado – disse um rapaz de uns dezesseis anos, pele negra e cabelos curtos –
Ola Ian!
Ian revirou os
olhos com o tom animado do outro. Pegou a mão da irmã e foi em direção ao rapaz
que esfregava os braços e olhava a neve acumulada no chão com curiosidade.
— Isso sempre
me encanta – disse ele olhando Ian com os olhos negros brilhantes e sorriso de
dentes muito brancos – Ola – ele olhou para Karol.
A menina se
escondeu atrás das pernas do irmão.
— É minha irmã
caçula Esteban, assim você assusta ela. Karol esse é um colega de escola,
Esteban Ruiz do México.
— Oi – disse
ela baixinho.
— Andem logo!
– gritou o capitão mau humorado do segundo andar – Desse jeito não terminamos
hoje.
— O educado é
o capitão Benito Callisto, ele é italiano.
— Vou deixar
vocês pra trás! – o capitão voltou a gritar.
Esteban pegou
a mala de Karol enquanto Ian pegava a sua e entraram no barco que zarpou em seguida. Ian segurou
a mão da irmã e desceu para o salão onde cerca de quinze crianças e
adolescentes conversavam ruidosamente.
— Ola! – eles
saldaram o rapaz que apresentou a irmã.
Ian gostava
daquela turma, era um grupo de vários paises e na sua maioria alunos pobres
bolsistas. Tinham que ter boas notas se quisessem manter a bolsa, por isso
estavam ali por que queriam estudar e não por que os pais haviam obrigado.
O iate parou e
Karol olhou curiosa para a claridade do sol que entrava pela vigia redonda.
— Onde a gente
ta mano?
— Brasil.
— Posso ir
ver?
— Vamo lá em
cima – disse Esteban todo alegre.
Tímida, Karol
segurou na mão dele e subiram a escada até o deque onde o sol iluminava uma
praia de areias brancas com coqueiros e matas verdejantes. Num píer de madeira
tosca havia um rapaz e uma moça acompanhados de um casal. Eram pessoas de pele
dourada, cabelos castanhos bagunçados pelo vento e grandes sorrisos.
— Oi Paulo, oi
Sandra – gritava Esteban.
Eles pararam
de falar em português e responderam em inglês.
— Como vai
Esteban? – disse Paulo acenando.
— Ola crianças
– disse o adulto sorrindo – Tenham um bom ano.
Eles se
despediram dos filhos com fortes abraços e recomendações sem fim que só
acabaram quando o capitão Callisto voltou a gritar.
“Que diferença
da minha família” – pensou ele ao ver a forma que a família se despedia.
— Finalmente
podemos ir para a ilha – resmungou o capitão voltando para a cabine de comando.
— Ola Ian –
disse Paulo para o rapaz e descendo para o salão.
— Oi yanque –
disse a irmã em tom debochado.
— Pensei que
tinha se perdido na mata com seus parentes – retrucou ele.
— Não meu
caro, eu sou boa conhecedora da natureza, já você eu imaginei que tivesse
virado sorvete lá em Nova
Yorque, mas vejo que Deus não é tão generoso.
— Seria
generoso se algumas daquelas cobras tivessem ti comido, o problema seria se a
coitada da cobra morresse envenenada.
— Vocês dois
dão dando um show na frente da menina – disse Jean subindo no deque.
Jean era
francês de cabelos negros encaracolados, olhos azuis, pele branca que não queimava
fácil com o sol. Jean sempre parecia um pimentão quando saia no sol.
Ian olhou para
Karol que na verdade estava se divertindo com a discussão dos dois os olhando
com um sorriso.
— Oi – disse
ela sorrindo para Sandra – Sou Karol, irmã de Ian.
— Essa bonequinha
é sua irmã?! – Sandra levantou uma sobrancelha – Coitada da menina.
Seu corpo doía,
até respirar doía na verdade. Fez um grande esforço para abrir os olhos e pelo
menos conseguiu abrir um olhando para um teto muito branco iluminado por um sol
cor de rosa.
— Que bom que
acordou – disse uma voz do seu lado e um rosto entrou no seu campo de visão.
Era um rapaz
se cabelos castanhos rebeldes e olhos azuis brilhantes. Ele sorriu e tocou na
sua testa.
— Como está?
O homem falava
inglês e ele agradecia em falar muito bem essa língua.
— Meu...
pai... – foi o que conseguiu gemer.
— Do seu lado.
Ele virou a
cabeça ofegando com a pontada de dor que sentiu e ficou aliviado ao ver seu pai
ali do lado com o rosto parcialmente escondido por um curativo.
— Ele está bem
– disse o outro – O curativo é por causa de um corte na testa.
Ele voltou a
olhar curioso para o homem se perguntando onde estava e o que tinha acontecido.
— Meu nome é
Rafael Larson. Consegue me dizer o seu?
— Nil...
Nilton Mendes. Meu pai Henrique.
— Nilton sei
que está confuso, mas é melhor conversarmos quando você estiver melhor.
Ele queria
perguntar onde estava e o que havia acontecido com o barco, mas seus olhos se
fecharam contra a sua vontade.
Rafael olhou
para o garoto preocupado. Ele havia tido cortes e varias costelas quebradas, já
o pai tivera um braço faturado e um corte profundo na testa. Segurou a mão
esquerda de Nilton com a sua direita e tocou a palma onde houve uma centelha
como um pequeno raio elétrico explodindo na sua palma.
— Azul – disse
um rapaz na porta do quarto.
Era alto e
magro, com cabelos loiros platinados e olhos castanhos sérios.
— Ola Marc.
— Uma centelha
azul é muito rara, não é?
— Certo Marc –
Rafael respirou fundo – Vamos conversar lá fora com um café.
Os dois saíram
do quarto de hospital para uma sala ali perto onde havia uma máquina de café e
poltronas confortáveis. A janela dava para jardins coloridos por tulipas e
violetas em meio aos raios alaranjados do por do sol. Um ar perfumado vinha com
a brisa que entrava pela janela aberta.
— Capuccino ou
expresso? – perguntou Rafael indo para perto da máquina de café.
— Simples e
com bastante açúcar.
Rafael pegou
um café e um capuccino e foi sentar perto de Marc.
— O menino tem
dois poderes – começou Rafael diante do olhar insistente do outro – Talvez por
isso não tenha sido descoberto. O pai
também tem uma centelha... vermelha.
— Mendes... –
Marc olhou pela janela – Não é uma família antiga ou conhecida, esse tipo de
centelha é tão antiga que ninguém mais lembra que existe.
— Conto com
você para investigar isso, eu tenho o espinhoso dever de avisar o conselho em
Londres.
Marc torceu o
rosto com desgosto ao pensar nisso. Ele preferia não ter que lidar com as
velharias baseadas na capital inglesa.
— Vou
investigar enquanto você lida com a “burrocracia” – disse ele se levantando –
Ah! Pelo pouco que consegui olhar no barco ele foi atacado por uma serpente
marinha, achei algumas escamas no rombo, mas as pessoas foram mortas por
vampiros.
Ele saiu
deixando Rafael com seus pensamentos. Ele terminou o café e saiu para o
corredor da clinica da escola. Era uma clinica que ficava no oitavo andar no
prédio da administração da escola.
Desceu para o
sétimo andar onde ficava a sua sala e pegou o telefone via satélite respirando
fundo ligou para o conselho.
Sara estava no
píer esperando os barcos que chegavam de toda a parte do mundo cheio de
crianças e adolescente barulhentos.
— Ainda aqui?
Sara revirou
os olhos ao ouvir a voz.
— Você de novo
aqui? – resmungou ela vermelha sem se virar.
Kane Neal
olhou altivo para ela. Ele era do Pais de Gales, alto e sério. Os cabelos
negros com reflexos azulados, olhos de um azul gelo assim como a mirada que ele
lançava para quase todos. Era um homem muito bonito fazendo grande sucesso
entre alunas do sexo feminino e alguns do sexo masculino, mas todos os alunos
eram unânimes em dizer que Kane era um carrasco e não tinha escrúpulos em dar
provas surpresa ou zerar a nota de um aluno.
— Neal eu
realmente não tenho tempo ou paciência para aturar você – ela deixou o rapaz
vermelho no píer e foi de encontro ao iate “Bruma” que chegava do Brasil.
— Ei
professora! – entusiasmado Esteban gritava acenando para ela.
Sara adorava
Esteban e sua turma. Eram bons alunos o único problema é que estavam sempre a procura
de problemas ou como diziam eles, eram os problemas que os procuravam.
— Como vai
Esteban?
— Estou feliz
por retornar para a escola – disse ele saltando para o píer com sua velha
mochila nas costas.
— Ola
professora Sara – gritaram os outros alunos que saíram correndo do barco para
dizer oi para ela.
Ian ajudou
Karol a descer que olhava em volta com olhos arregalados.
— Como vai
professora Garcia?
Ian era
educado, mas Sara se arrepiava toda quando era chamada pelo sobrenome. Para ela
que era brasileira parecia um costume não só estranho, mas uma forma de
distanciamento.
— Vou bem, mas
vou melhorar se você parar de me chamar pelo sobrenome.
— Desculpe
Professora Sara – ele deu um leve sorriso – Gostaria de apresentar minha irmã
caçula, Karol.
— Ola Karol –
disse para a menininha que estava agarrada ao braço do irmão como um salva
vidas.
— Ola – olhou
para a moça – Do que você da aula?
— História.
Karol torceu o
nariz e Sara caiu na risada enquanto Ian disse contrariado.
— Que feio
Karol!
— Mas ela ta
certa. Historia pode ser chata mesmo, mas eu garanto que a minha aula é bem
movimentada.
— Nisso ela
esta certa – disse Sandra rindo – Estamos sempre acabados no final, mas a
senhora não é tão dura com os menores, não é? – ela parecia subitamente
preocupada olhando Ian que engolia em seco.
— Não há nem
comparação gente. Não daria as mesmas aulas pesadas que dou para vocês para os
pequenos.
Ambos
respiraram aliviados.
Havia um
ônibus parado ao lado de uma estrada asfaltada que rumava para a escola que
ficava a três quilômetros do mar. Era um grande complexo de três prédios com
várias construções baixas que incluía uma quadra coberta, um campo de futebol,
laboratórios e estufas. Tudo era cercado por grandes jardins que terminavam nas
matas que cercavam o complexo. Ao norte podia-se ver as torres de um velho
castelo onde tremulava a bandeira da Inglaterra o que era motivo de resmungos
dos alunos de outras nacionalidades.
O ônibus parou
em um pátio em forma de meia lua que era compartilhado pelos três prédios.
— Vamos pegando
seus guias pessoal – dizia Sara na porta do prédio que servia de dormitório –
As regras não mudaram e acrescentamos algumas, como prisão perpétua para quem
for até as matas célticas. Tenham um bom ano.
— Mano onde eu
fico? – Karol estava assustada em ficar sozinha.
— Pode deixar
que eu ti mostro Karol – disse Sandra para a menina – O dormitório feminino
fica nos últimos andares – olhou Ian – Pode me dar a mala dela.
— Quem pediu
para você fazer isso?
— Me da a mala
e vai pastar! – ela tomou a mala de Ian e segurou a mão de Karol que ria da
cara do irmão.
— Vocês dois
não podem ficar sem brigar – resmungou Paulo passando por ele com Jean que ria.
— Ei Ian –
Esteban gritava – Ficamos no mesmo quarto!
— Que Deus me
ajude – resmungou ele arrastando a mala.
— O Jean e o
Paulo também!
— Cala a boca
Esteban! – disse Jean contrariado – A escola inteira precisa ouvir?
— Han? –
Esteban berrou colocando a mão na orelha como se não tivesse escutado – O que?
Não ti ouvi!
As pessoas em
volta caíram na risada e Ian segurou a gola do rapaz negro arrastando ele.
Os quatro
subiram pelo elevador para o quinto andar onde ficava o quarto deles. Eram
quartos amplos muito parecidos com um apartamento. Tinha dois quartos com uma
sala e um banheiro. Paulo pegou Jean e arrastou ele para um quarto deixando Ian
com um falador Esteban no outro.
— Cara é bom
ta de volta. La em casa minha mãe não me da paz e eu não tenho o menor jeito
com a terra. Deus eu tive que ajudar a arrancar batatas quase minhas férias
todas. E as chuvas? Deus nunca vi tanta água como nesse ano. Ficamos presos na
fazenda, as estradas ficaram intransitáveis... – uma almofada que saiu voando
no seu rosto fez ele parar.
— Dá um tempo
Esteban!
— Tempo pra
que? A vida é tão curta para perdermos tem... – dessa vez foi um tênis que
quase o acertou.
— Se não ficar
quieto a próxima coisa vai ser um raio.
Esteban
preferiu dar um tempo, sabia o quanto Ian era bom com choques elétricos.
O ultimo barco
que chegou vinha da Inglaterra com trinta alunos daquele país. Eram na sua
maioria adolescentes entre quatorze e dezesseis anos, mas haviam três crianças
de dez anos que estavam quietas no seu canto.
— De volta a
prisão – resmungou William para Brooke que estava ao seu lado mascando chicletes.
Willian Sant
James era filho de duques ingleses e tinha o hábito de se achar melhor que o
resto dos alunos por ser nobre, rico e pertencer a uma família antiga. Era de
estatura mediana, olhos azuis e cabelos loiros. Seus músculos se mostravam da
camiseta que usava e era muito bom em artes marciais. Todos na escola
procuravam ficar afastados dele e de sua gangue.
Brooke Provost
era namorada de William e também gostava de atormentar os outros. Era alta, de
cabelos longos e castanhos muito lisos. Os olhos de um azul profundo parecidos
com as águas profundas do mar. Seu corpo esguio era bem formado para seus
quinze anos e estava sempre pronta para criar problemas na escola.
Eles desceram
do barco acompanhados por mais oito garotos. Os outros foram saindo mais
lentamente querendo ficar o mais longe possível daquela turma, o ultimo a sair
foi um garoto alto, cabelos castanhos amarrados em um rabo de cavalo, olhos
negros e frios. Era totalmente anti social com todos e estava sempre pronto
para entrar em uma briga onde sempre saia vencedor depois de dar uma bela surra
no oponente. Já havia sido ameaçado de ser expulso várias vezes, mas o pai
dele, um grande empresário inglês, era doador de muitos fundos da escola alem
de pertencer a família que chefiava o conselho á anos.
Gael Zeke
Kendra, filho caçula de uma família de cinco irmãos, odiava a família e tinha
prazer atazana-los. Os pais dele não entendiam de onde vinha aquele ódio.
Haviam procurado dar o melhor para o filho, o mesmo amor que haviam dado para
os mais velhos, mas Gael os rechaçava sempre desde de que descobrira que era o
primeiro demago da família em mais de cinco gerações e era motivo de desagrado
por todos os Kendra que o via como um mau agouro. Mesmo estando em pleno século
vinte e um as pessoas ainda acreditavam que um demago não passava de prenuncio
de má sorte e toda essa crendice caiu em cima de Gael aos dez anos quando
chegara a escola.
Alem de Rafael
era o único demago da escola e isso só acirrou ainda mais sua raiva levando ele
ao isolamento. A maioria dos alunos tinha medo de demagos e os outros medo
dele, já que era forte, rápido e especialista em varias artes marciais, até
mesmo William tinha receio dele apesar de enfrenta-lo com medo de perder o
posto de chefe da sua gangue.
Gael recusou
ir no ônibus e colocando a mochila nas costas foi andando pela estrada
observando as matas com calma. Era relaxante não ter ninguém por perto olhando
estranho para ele ou ter sua família o olhando com pena. Ali ele se sentia
livre e em paz. Quando
finalmente chegasse a idade adulta ele pretendia ir para um lugar assim, longe
de tudo e todos.
Já era noite
quando Nilton finalmente acordou. Olhou o quarto de hospital onde estava com o
pai. Era um quarto simples com as duas camas, uma mesa com duas cadeiras, duas
poltronas, uma de cada lado das camas, um armário e uma grande TV de plasma na
parede. Uma luz suave vinha do abajur em uma mesinha entre as camas.
— Nil? – foi
um alivio ouvir a voz rouca do seu pai. Ele se virou bruscamente para o lado
experimentando uma pontada na cabeça.
— Pai!
Seu pai estava
com o braço engessado, o rosto com o curativo estava pálido.
— Filho você
esta bem?
— Estou, mas o
senhor quebrou o braço.
— Isso não é
nada – ele sorriu fraco – Estamos vivos.
— O que
aconteceu pai? Eu só me lembro do senhor me arrastando para a casa de máquinas.
— Nem eu mesmo
sei filho – ele olhou para o teto – Havia algo na noite atacando as pessoas e
eu só pensei em ti tirar dali.
— O senhor
acha que os outros estão mortos?
— Não sei
filho – ele olhou penalizado para o olhar de medo do menino – Gostaria da saber
onde estamos.
— Num lugar
que fala inglês. Quando acordei mais cedo um homem estava aqui e conversei com
ele nessa língua. Acha que estamos nos EUA?
— Impossível,
estávamos a mil quilômetros da costa brasileira indo rumo á África.
— Depois
daquela tempestade eu não sei...
Nesse momento
a porta abriu deixando uma moça entrar. Era uma mulher exuberante de cabelos
ruivos encaracolados, rosto coberto de sardas, olhos azuis que brilhavam
vibrantes. Ela vestia um jaleco branco com o nome Caroline Anderson.
— Meus
pacientes acordaram, que bom! – ela também falava inglês com o característico
sotaque da parte central dos EUA – Como estão?
— Doutora meu
nome é Henrique e gostaria de saber como está meu filho – o homem parecia
aflito.
— Bem levando
em consideração o estado que chegaram aqui. Seu filho esta com duas costelas
quebradas e um grande galo na parte posterior da cabeça o senhor teve o braço
fraturado e um corte profundo na testa. O quadro geral de vocês dois é bom.
— Onde
estamos? – Nil estava morrendo de curiosidade para saber.
— Esta parte o
diretor Smith poderá explica-los. Vou examina-los e chamar ele para que tenham
a sua conversa.
Eles fez um
rápido exame reafirmando que eles estavam bem e saiu para chamar o tal diretor
Smith. Logo o mesmo rapaz que havia conversado com Nilton entrou sorrindo.
— Boa noite.
Como estão?
— Senhor
Smith? – perguntou Henrique surpreso por ver um rapaz de não mais de trinta nos
com brilhantes olhos azuis.
— Rafael, por
favor – ele deu uma risada – Senhor Smith me faz sentir muito velho.
Ele sentou
perto da cama de Henrique olhando sorrindo para os dois.
— Senhor...
hã... Rafael – Henrique se atrapalhou – Onde estamos?
— Numa ilha
particular.
— Ilha?! Ao
sul?
— Agora? Não
sei a localização exata.
O homem olhou
o diretor como se ele tivesse ficado louco. Como ele não sabia onde a ilha
estava “naquele momento”?
— Como chama a
ilha? – perguntou Nil curioso.
— Avalon.
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