Capitulo VI
Quando o despertador tocou às
cinco da manhã Mauro gemeu e colocou o travesseiro em cima da cabeça ao ver que
ainda era escuro lá fora.
Arrastou-se para o banheiro onde
tomou um banho para acordar e vestiu-se com uma camisa de mangas longas por
causa do sol, uma calça jeans mais velha, meias e as botas.
Saiu para o lusco fusco da manhã.
No horizonte já havia uma leve claridade e ele podia ouvir os sons do
amanhecer: os pássaros cantavam com intensidade, um galo anunciava um novo dia
e em algum lugar uma vaca mugia.
Andou até a casa de sua mãe e
entrou pela porta da cozinha. Ali Duda já estava a toda preparando o café.
— Bom dia Mauro – disse ela
sorrindo e tirando do forno uma assadeira com pães – Dormiu bem?
— Dormi como uma pedra, obrigado. Precisa de
ajuda?
— Bem, cê sabe cozinhar?
— Han... – ele coçou a cabeça –
Não.
— Então senta ai e coma seu café.
Logo todo mundo vai ter se levantado e a lida começa.
Mauro sentou-se à mesa e Duda
colocou diante dele pão, queijo, leite, café e ovos mexidos. Mesmo sendo cedo
ele se esforçou para comer tudo. Nesse meio tempo a casa começou a ganhar vida
e o primeiro a chegar foi Valentim vestido com uma camisa azul de manga longa,
calça jeans azul e botas de cano alto. Seus cabelos estavam molhados e penteados
para trás e ele trazia um chapéu na mão parecido com aqueles que Indiana Jones
usava nos filmes.
— Bom dia Duda – disse ele para a
moça ignorando Mauro.
“Bom, dois podem jogar esse jogo”
pensou ele atacando os ovos com fúria, sua vontade era que fosse a cada do
idiota à sua frente.
— Bom dia Valentim e caso não
tenha visto, o que acho improvável, Mauro está bem na sua frente e também
merece um bom dia.
O outro olhou contrariado para a
moça, mas resmungou um bom dia para Mauro que respondeu de má vontade também.
— Pensei que ia ter que te
arrancar da cama – atacou Valentim com sarcasmo.
Mauro não respondeu continuando a
comer. Para o seu deleite Valentim ficou vermelho ao ver que ele não respondia.
— Coma logo que temos que sair –
mandou o outro e cada vez mais Mauro bolava planos para matar o enteado de sua
mãe.
Assim que acabaram saíram para o
dia. O sol estava nascendo com alguns raios que escapavam do horizonte banhavam
as árvores mais altas. Um vento frio, mas revigorante soprava e Mauro respirou
fundo se sentindo vivo depois de muito tempo. Era como sair de um longo tempo
em uma prisão.
Com cara de quem ia para a forca,
Valentim levou ele para a garagem. Era um galpão largo e comprido com três caminhonetes
S10 cabine dupla sendo duas prateadas e uma preta e uma moto vermelha suja de
lama.
Valentim foi até a caminhoneta
preta e a destrancou fazendo um sinal para que Mauro entrasse.
Enquanto andavam pelos campos nem
um dos dois trocaram uma palavra e o rapaz agradecia por isso já que ainda
tinha vontade de matar o outro.
Atravessaram campos de soja e
foram para o sul onde grandes pastos se estendiam por todo o lado. Perto de uma
mata havia um grupo de pessoas perto de uma cerca semi pronta e uma pilha de
mourões.
— Bom dia pessoal – disse Valentim
saindo do carro, Mauro o seguiu olhando para os homens.
Eram fortes e altos em um total
de cinco pessoas.
— Esse é Mauro e vai ajudar vocês
– o sorriso dele deu calafrios no rapaz.
— Parece que ele vai quebrar
Valentim – disse o mais velho dele – Não preciso de um guri aqui e sim de
homens fortes para terminar a cerca antes dos bois do seu pai chegar.
— Será que posso falar com você Giovanni?
– perguntou Valentim para o mais velho e os dois se afastaram deixando um
constrangido Mauro para trás.
— Não se preocupe – disse o mais
jovem deles chegando perto de Mauro – Meu nome é Heitor e Giovanni é meu pai. Não
esquenta que o latido é pior que a mordida. Esses são Luis Fabio, Murilo e
Francisco.
— Muito prazer – disse Mauro para
os outros que o saldaram com educação.
Heitor era bem alto, devia ter
fácil mais de um metro e noventa. Os cabelos castanhos apareciam em cachos pelo
chapéu de palha que usava e seus olhos eram um brilhante verde claro que
pareciam hipnotizar quem olhasse para ele. O sorriso parecia fácil nos seus
lábios cheios e sensuais que davam vontade de beijar...
“Foco Mauro!” resmungou consigo
mesmo “Não é hora para pensar em beijos ou homens, alem de tudo ele não podia
ser gay nunca! Um cara cheio de músculos e viril.”
Durante sua vida ele viveu na
pequena cidade. Seu pai nunca deixou sair de lá e estava acostumado aos gays
que viviam lá, na verdade os poucos que via na rua antes que seu pai soltar os
cachorros neles. Alguns eram tão afetados e efeminados...
— Vamos então trabalhar –
Giovanni voltando para os outros com a cara inda mais fechada.
Valentim foi embora e Mauro
agradeceu por isso, mas minutos depois ele não tinha mais nada a agradecer.
Giovanni o colocou ele para
carregar os mourões até onde os outros furavam os buracos e construíam a cerca.
Cada mourão tinha um metro e
oitenta de altura, eram feitos de eucalipto tratado, com aproximadamente oito centímetros
de largura e pesavam cerca de cinqüenta quilos cada, se levarmos em
consideração que Mauro pesava cinqüenta e cinco ele estava tentando carregar o
próprio peso no ombro.
Heitor pediu para o pai deixar
ele ajudar os outros a esticar o arame, mas o pai se negou deixando o filho bem
contrariado.
Não vendo outro jeito Mauro
colocou um dos mourões em pé e dobrou o joelhos numa tentativa de colocar seu
ombro no meio dele e o içar, mas algumas vezes ele não tinha sucesso e caia
para trás com madeira e tudo.
Seu ombro protestava e gritava de
dor na segunda entrega e cada vez eles estavam ficando mais longe. Por volta
das onze horas Giovanni deu ordem de parada e Mauro caiu exausto perto da pilha
de madeira de cerca achando que ia ter que amputar o ombro tal à dor.
— Aqui – Giovanni entregou para
ele um pano grosso e dobrado – Coloque em cima do ombro quando pegar o próximo mourão
vai ajudar com a dor. Está fazendo um bom trabalho – disse quase a contra
gosto.
Uma caminhoneta prateada se
aproximou. Ele pode ver a mãe no volante.
— Oi dona Sacha! – Heitor acenou
alegre.
Sacha parou o veiculo perto
deles.
Ela estava preocupada com o filho
desde cedo e ao vê-lo ali com a cara cansada e branca ficou aflita. Aquele era
um serviço duro até mesmo para homens mais fortes, por isso mesmo as cercas
eram feitas pela equipe de Giovanni que atendiam toda a região e eram homens
altos e fortes.
— Bom dia garotos. Que tal
almoçar?
A fazenda oferecia a alimentação de
quem trabalhava nela.
Cada um foi buscar correndo sua
marmita junto com um litro de suco, mas Mauro continuava ali parado. Ela pegou
uma das marmitas e uma garrafa de suco e foi até ele.
— Almoço? – perguntou ela
sorrindo e entregando as coisas para ele.
— Obrigado mãe.
— Como está o trabalho – ela sentou
perto dele.
— Meio pesado, mas estou dando
conta – omitiu a parte que seu ombro doía como uma merda e que ele não sabia
como continuar.
— Eu queria conversar com você,
queria que nos conhecêssemos novamente. Sei que o tempo que perdemos não vai
mais voltar, mas podemos tentar algo de agora em diante.
— Claro mãe. Eu gostaria.
Ela sorriu para ele e dando um
beijo em seu rosto foi embora. Ele conseguiu engolir um pouco, mas a dor embrulhava
o seu estômago.
Giovanni teve que voltar a cidade
para buscar mais arame e Heitor o empurrou para longe das toras e começou a
carregá-las ele mesmo. Foi ajudar aos outros a fixar elas no chão e assim
quando o pai dele estava de volta boa parte da cerca estava feita e restava
ajustar o arame que não era farpado para não causar estragos no couro dos
animais.
Heitor levou um exausto Mauro em
casa.
— Deite e descanse – disse ele se
inclinando para o menino.
— Nem precisa dizer duas vezes –
resmungou ele massageando os ombros – Acredite que vou ter o maior respeito
pelas cercas de agora em diante.
— Eu não sei o que deu na cabeça
do meu pai para obrigar você a carregar os mourões. Você tem um corpo magro e
delicado, não é para isso.
— Acho que vou conseguir uns músculos
agora – disse ele em tom de riso, mas o rosto vermelho pelo elogio.
— Você está corando! Que gracinha!
– ele apertou as bochechas de Mauro que ficou ainda mais vermelho e bateu nas
mãos dele.
— Ai! Odeio quando apertam as
minhas bochechas!
— Ninguém cora mais hoje em dia,
só achei uma graça – ele se aprumou no volante – Até a manhã Mauro.
— Tchau!
Mauro entrou na estrebaria
tocando no rosto lembrando das grandes e ásperas mãos do trabalhador e seu
pênis teve o desplante de começar a endurecer.
— Merda – resmungou ele para um
dos belos cavalos malhados que estavam na baia e voltou a subir as escadas.
Retirou a roupa e foi para o
pequeno banheiro onde olhou a mancha roxa que já se formava em seu ombro e para
o membro desperto.
— Maravilha – resmungou ele –
Preciso de um banho gelado. To tão cansado que nem me masturbar eu consigo.
Ficou um bom tempo debaixo do
jato do chuveiro e depois se arrastou para a cama. Não tinha energia para
jantar e nem queria ver a cara do Valentim ou ia acabar fazendo bobagem. Enfiou-se
no meio dos cobertores e apagou acordando com alguém batendo na sua porta.
Gemendo percebeu que eram oito da
noite. Abriu a porta e deu de cara com a sua mãe com uma expressão preocupada
em um prato coberto por um guardanapo.
— Mauro você não foi comer e eu
fiquei preocupada.
— Desculpa mãe, mas o serviço me
deixou cansado. Acho que estou destreinado – ele deu uma risada.
— Mas precisa comer – ele deixou
o prato na mesa e sentou na cadeira – Venha menino eu só vou embora quando
limpar o prato.
Ele não teve opção em sentar e
começar a comer o frango com polenta que estava muito bom. Nesse meio tempo ele
começou a contar para ela sua infância e adolescência pulando algumas partes
como as agressões do pai.
— Você nunca foi à faculdade
filho?
— Eu sou muito burro para isso –
disse ele dando de ombros e não ligando.
— Quem disse essa bobagem?
— As minhas notas, meu pai, todo
mundo.
— Mauro eu não acredito nisso! Você
se deixou influenciar pela opinião dos outros? Eu não acho você burro, aliais
que definição idiota! As pessoas podem ser boas em uma coisa e não em outras se
serem consideradas burras!
— Eu não sei mãe. Eu nunca fui
bom em nada.
— Pois a gente vai descobrir –
ela fez uma caricia em sua mão – Agora vá dormir para descansar – ela lhe deu
um beijo e pegou o prato – Boa noite meu amor.
— Boa noite mãe.
Ele voltou para a cama com o
coração aquecido pelas palavras dela. Por muito tempo seu pai o xingou de burro
e retardado e isso acabou pegando na cidade e na escola. As suas notas foram
caindo no mesmo ritmo que o bullyng que sofria.
Socou o travesseiro. Chega de
pensar no passado, o presente já era ruim demais para ficar remoendo o que já
passou.
~~***~~
A semana passou como um borrão de
cansaço para Mauro que nem mesmo vontade de xingar Valentim tinha, mesmo porque
pouco se viam. Ele tomava café sedo e Heitor passava e pegava ele, à noite Duda
lavava o jantar dele o que fora um ótimo arranjo mesmo que sua mãe parece
desgostar.
Ele acabou conhecendo mais Heitor
e Giovanni que a família de sua mãe.
Depois do primeiro dia ele meio
que conquistara o respeito do mais velho, mas inda não deixava de carregar os
mourões.
Na sexta feira as quatro faltava
apenas uma hora para o fim do trabalho e o rapaz não via a hora e ir para casa
e dormir umas vinte e quatro horas.
Segurou o ultimo mourão (graças a
Deus!) e foi em direção a equipe que estava subindo um terreno bem inclinado o
que era complicado para ele ao arrastar dezenas de quilos de madeira para cima.
Ele podia ouvir Giovanni
resmungar de Francisco dizendo que o trabalho estava torto e Chico resmungava
que ele não via nada torto e por ai vai. Giovanni não estava feliz se não
reclamava de algo.
Mauro levantou a cabeça olhando
para Heitor que estava em cima do morro rindo para ele.
De repente seu pé prendeu em algo
e o tombo foi inevitável. Ele caiu com tudo no chão e a tora de madeira caiu em
cima de seu ombro machucado o que lhe rendeu um grito de dor e ele acabou
ralando pelo capim.
— Mauro! – Heitor gritou o correu
para ele conseguindo parar a sua queda, mas o rapaz estava branco de dor e já
meio inconsciente – Mauro!
Ele escutou Heitor o chamar, mas
parecia vir de muito longe e ele estava mais interessado em cair naquele
escuridão onde não havia mais dor dilacerando o seu braço. Depois disso tudo
foi um borrão de vozes e cores até que ele ficou um pouco mais consciente ao
ser colocado em uma maca por Heitor.
— Heitor – resmungou ele
segurando a barra da camisa dele.
— Mauro graças a Deus. Olha você está
em um hospital e vão ti levar para fazer exames.
Ele não queria ficar nas mãos de
desconhecidos, mas eles o levaram pelos corredores brancos e insípidos do
hospital para uma sala de raios X. Depois havia um médico perto dele falando
dele ter deslocado o ombro e que iam colocar no lugar e antes que ele pudesse
pensar o homem segurou seu ombro e o empurrou para dentro. Se ter o mourão
caindo no seu braço doeu recolocar o ombro no lugar foi dez vezes pior e
lagrimas de dor começaram a descer por seu rosto. Ele foi colocado no soro
depois de ter o ombro enfaixado para diminuir a dor. Finalmente a dor pareceu
ceder um pouco.
Minutos depois algumas pessoas
entraram na sala de recuperação era sua mãe e Wagner.
— Mauro! – ela tocou na minha
testa com carinho – Você me deu um grande susto sabia?
— Acho que topei com um buraco de
tatu. Deviam proibir eles de fazer casas no pasto – tentei fazer um pouco de
humor, mas nem um dos dois estava para isso.
— Porque você estava carregando
madeira Mauro? – Wagner parecia bastante chateado.
— Foi culpa minha Wagner. Eu
achava que conseguia – o que menos queria era que Giovanni ou Heitor se
metessem encrencas por minha causa.
— Sabia que podia ter mais que um
ombro deslocado Mauro? Você podia ter morrido ali e ter metido a mim a Giovanni
em sérios problemas. Percebe isso!
Mauro engoliu em seco. Por um
momento a figura de Wagner e seu pai se misturaram e ele começou a tremer. Droga
ele não tinha culpa! Não merecia isso.
— Wagner – Sacha queria dar uns
tapas no marido – Olhe para ele! O menino está tremendo com seus gritos!
Ele parou e olhou envergonhado
para o rapaz pálido ali deitado. Sem camisa ele podia ver o corpo magro do
menino e o ombro enfaixado, mas foram os olhos tomado de terror que o deixou
pior. Sacha contara a ele sobre o ex marido e se Luis Gustavo fazia o mesmo com
o menino era claro que ele tinha medo, na verdade pavor, de explosões de raiva.
— Desculpe Mauro – ele tocou com
delicadeza o ombro que não estava machucado – Eu exagerei.
— O senhor está certo – ele respondeu
sem olhar para a mãe ou Wagner – Eu podia causar um problemas dos grandes para vocês
já que nem mesmo documentos eu tenho. Eu nunca quis isso mãe, Senhor Wagner. Sua
família me acolheu no momento mais difícil dela e eu não sei como agradecer,
mas acho que tenho que ir embora, talvez voltar para casa.
— Mauro – Wagner levantou o
queixo dele – Você vai para casa sim, mas a sua casa de verdade, aqui em Mendes
conosco e não com o homem violento que seu pai é. Jamais deixarei que volte
para lá e ser ferido de novo, entendeu? Desculpe ter sido um idiota, mas às
vezes eu faço isso, pergunte aos outros.
Droga ele não queria chorar, mas
não conseguia mais resistir e desabou em lagrimas no ombro da mãe que afagava
os seus cabelos com amor falando palavras de conforto para ele, mas outra coisa
fez ele estremecer. Quando Valentim descobrir o que tinha acontecido iria
entregar ele para o pai?
oi... amo seu blog e adoro de paixão seus contos.
ResponderExcluirfico olhando toda hora para ver se tem postado algo novo rsrsrs amo acho cada um melhor que outro estou amando mauro e também valentin...
brigadão.
bjs de sua fã vilma
oie..adroro seus contos, estou dentindo falta "Rumo ao Paraiso"...vc vai dar continuidade?...ESPERO Q SIM...
ResponderExcluirBJOS
GISELLY
É difícil ler uma história sua sem ter crise de risos ou de lágrimas... É incrível a capacidade e a profundidade de seus textos. sou seu fã. Não tem jeito.
ResponderExcluirMais uma história linda...! Mauro, Valentim, Heitor... o que vai dar nesse triangulo? Muito obrigado por nos presentear com mais uma narrativa sensível, humana, bem contada e com muita emoção! Felicidades.