Capitulo V
Vozes infantis sussurravam na porta do quarto olhando para os dois vultos dormindo na pequena cama.
— Ele tá dormindo – disse Jason para o irmão.
— Assim fica mais legal – Jared abriu a porta e pulou em cima de Mathew e Shon gritando – Bom dia!
O príncipe deu um pulo e caiu da cama levando Shon consigo. Ao sair do emaranhado de cobertas viu os dois pestinhas menores rindo. Shon esfregava os olhos olhando para os dois.
— Vocês são uns chatos – ele disse com a voz rouca voltando a se arrastar para a cama.
— Vocês acordam todo mundo assim? – Mathew se levantou tentando arrumar os cabelos.
— Vamos tirar leite! – a dupla gritou toda feliz.
Mathew não tinha nem idéia de como se tirava leite, mas achava que deveria ajudar de alguma forma. Olhou pelas vidraças para o dia cinzento, o sol ia demorar um pouco para aparecer.
Jogou as cobertas de volta para Shon que já estava dormindo novamente. Ele saiu do quarto indo para o banheiro onde lavou o rosto na água gelada e encontrou um pente de madeira onde tentou arrumar os cabelos emaranhados. Ele havia perdido sua tira de coura e agora eles tinham que ficar soltos, dançando no seu rosto e ombros.
Se sentindo revigorado desceu as escadas bocejando e encontrou a cozinha de vento em popa.
— Bom dia! – disse Sara toda animada mexendo em uma panela no fogão.
— Bom dia – disse Paul olhando-o de relance e indo colocar pães no forno.
— Bom dia – disse Gabe entrando com cara de sono.
— Bom dia para todos apesar de ainda ser noite – resmungou Mathew sentando na mesa da cozinha e segurando a cabeça com a mão – Ainda to dormindo.
— Podia ter levantado mais tarde príncipe – disse Paul franzindo as sobrancelhas.
— Seus dois meninos menores me acordando dizendo que era hora de tirar leite.
— E eles que um príncipe vai tirar leite? – o tom de Gabe era debochado.
— Ora por que não? Não deve ser mais difícil que os exercícios da escola de guerra.
— Não cai nessa – Sara colocou a mão na cintura – Aquela vaca é o bicho mais chato e ranzinza que eu conheço!
— Deixa ele tentar Sara – Paul tinha um sorriso sardônico que arrepiou Mathew – Imagino que uma vaca não seja páreo para um grande guerreiro.
O príncipe fez uma careta para ele e Gabe escondeu um sorriso. Parecia que ele estava se recuperando de ontem à noite o que o deixava aliviado.
— Cadê o Shon? – perguntou Sara abrindo e fechando armários sem esbarrar em nada.
— Dormindo – resmungou Mathew tentando afastar seus cabelos do rosto.
— Nunca vi ninguém mais preguiçoso para acordar que esse menino – resmungou Paul – O que há com o seu cabelo? – perguntou ele ao perceber a impaciência do outro.
— Eu perdi minha tira e agora eles estão me incomodando.
— Humpf! – Paul retirou a tira da própria trança e foi até Mathew – Deixa eu dar uma ajuda.
O príncipe se surpreendeu quando as mãos calejadas seguraram seus cabelos de forma delicada e com destreza começaram a fazer um rabo da cavalo baixo. O corpo todo dele se arrepiou ao sentir ele passar os dedos por entre a suas mechas e teve vontade de gemer. Queria ficar assim para sempre.
— Prontinho – Paul retirou as mãos olhando para Mathew w retirando alguns fios de cabelos do rosto dele – Agora você este pronto para a Sindy.
— Sindy?!
— É o nome da bendita vaca – resmungava Sara.
— Você ta com ciúmes da vaca Sara? – Gabe colocou as mãos na cintura.
— Da onde você tirou essa idéia seu projeto de homem?
— Chega, chega, chega! – Paul levantou Mathew pelo braço e empurrou-o junto com Gabe porta afora – Vão buscar o leite ou esse café não sai hoje!
Saíram para uma manhã fria e úmida. O céu estava azul anil e uma leve claridade do leste mostrava que o sol chegava. Alguns fiapos de neblina se agarravam por entre as plantas do jardim e se espiralavam pelo gramado. O ar tinha cheiro de mato e terra molhados misturado com um leve aroma de mel. Pássaros passaram por cima de suas cabeças grasnando e saldando o novo dia.
Eles foram até uma parte do estábulo onde Mathew não tinha reparado e onde ficava uma um cubículo com uma vaca que mascava calmamente um tanto de feno e grãos.
Era uma vaca malhada de branco e preto que os olhou de forma desintereçada.
— Essa é a vaca que a Sara não gosta?
— Deve ser por que as duas são parecidas – Gabe tinha um sorriso de lado.
— Não fale assim, sua irmã é muito bonita.
— A Sara?! – Gabe olhou para Mathew como se ele tivesse perdido a cabeça – Ela é uma chata, mandona e implica com tudo que eu faço. Eu não acho ela bonita.
— É por que vocês são irmãos – apontou para a vaca – Agora me mostre o que eu tenho que fazer antes que o seu pai venha nos buscar pela orelha.
— Ele é bem capaz – disse Gabe indo até um canto onde havia um armário rústico retirando um balde de ferro e um pano – Tem que limpar as tetas dela e lavar bem a mão, meu pai sempre disse que temos que ter higiene. Tem uma torneira do lado de fora.
— Eu tenho que limpar o que?! – Mathew olhava para o pano e para Gabe.
— As tetas – o menino apontou para as mamas da vaca e o outro não pode deixar de fazer cara de horror.
— Você é da realeza mesmo – resmungou o menino puxando ele pela mão até a torneira onde molhou o pano e lavou as mãos fazendo Mathew também lavar.
Depois voltaram para a vaca. Gabe agachou limpando a teta da vaca e lavou a mão novamente, só então mostrou para o outro o que deveria fazer.
— Você segura a teta, aperta e puxa, assim – um jorro de leite saiu direto para o balde e a vaca nem pareceu se importar, continuou ruminando seu feno – Fácil!
Mathew olhou com o cenho franzido para a vaca e pegou o balde tentando fazer o mesmo que Gabe tinha feito. Era muito mais difícil do que aparentava e assim que apertou a teta da vaca esta mugiu alto e bateu a perna no balde fazendo com que este e o príncipe caíssem de bunda no chão.
— Mas que merda! – Mathew não pode deixar de xingar.
Gabe tentava ficar sério, mas começou a rir descontrolado.
— Você sabia, não é? – Mathew perguntou de forma acusatória.
— A Sindy é muito sensível! – ele riu ainda mais e Mathew deixou a zanga de lado lembrando o tormento que vira nos olhos daquele garoto à noite.
— Bem senhor sabe tudo, vou ti mostrar como segurar nas tetas de uma moça – dessa vez foi Mathew quem riu ao ver a cara vermelha de Gabe.
O príncipe lavou o balde e as mãos novamente e agachou começando a falar e acariciar mansamente a vaca que o olhou de lado e recomeçou a ruminar. Mathew conseguiu com delicadeza ir pegando o jeito, mas logo seus braços e pernas doíam. Finalmente ele pode se levantar com o balde cheio de leite.
— Acho que consegui – riu ele vitorioso para Gabe – Vamos? Estou morto de fome.
Assim que eles saíram, o menino começou a lançar olhares curiosos para ele.
— O que há Gabe? – perguntou ele olhando o menino.
— É que... hã... você tem namorada? – ele parecia muito embaraçado ao fazer essa pergunta.
— Na verdade não. Passo tempo demais em missões para ter conseguido alguém.
— Nem mesmo um namorado? – ele parecia um tomate maduro.
— Não Gabe, eu não tenho ninguém. Você já teve alguém?
— Eu?! – ele estava tão embaraçado que tropeçou – Eu não tenho tempo para isso, tenho que ajudar o meu pai a cuidar da casa e das crianças. Eu só queria saber como era ter um namorado.
— Você gosta de alguém?
— Não – ele parecia desolado com isso – A maioria nem olha pra mim, afinal eu sou um rejeitado.
— A verdade Gabe é eles que estão perdendo em não conhecer um garoto corajoso e inteligente como você – sorriu para ele.
— Você me acha inteligente? – ele parecia muito cético – Eu nunca freqüentei uma escola, elas são dos padres e eles não aceitam pessoas como eu. Foi meu pai que me ensinou tudo o que sei.
— Eu não entendo o que esses padres pensam – Mathew resmungava furioso – Sei que a igreja aqui tem muita influencia, mas em Gaulesh as escolas são do reino e todos estudam nelas.
— Qualquer um? – perguntou Gabe cético.
— Todos. Apesar de não me dar bem com meus pais não posso dizer que foram maus reis, ao contrario, o povo os ama e respeita e eles servem de exemplo para muitos reinados por ai.
Eles chegaram até a casa e entraram no cozinha onde o cheiro de pão assado e panquecas fritas enchia o ambiente.
— Finalmente – resmungou Paul tomando o balde de Mathew – Pensei que tinham ido até a cidade buscar leite.
— Muito obrigado Mathew por sua ajuda – o príncipe imitou Paul contrariado – Deveria mostrar um pouco de agradecimento!
— Pra que? Você esta fazendo um serviço tão bom se agradecendo que não quis interromper.
— Há! Há! Muito engraçado – resmungou o outro sentando na mesa e afanando um pão.
— Cuidado ta quente! – Sara gritou tarde demais.
— Ai merda! – Mathew largou o pão em cima da mesa e balançou a mão.
— Isso ti ensina a não ser guloso – disse Paul pagando um pano de prato, molhando e jogando para ele – Coloque na queimadura para dar um alivio, vou buscar aloe vera – antes de sair virou-se para seu filho – Gabe chame seus irmão e arranque Shon daquela cama!
Perto da porta da cozinha, Paul havia plantado moitas de aloe vera que usava para fazer seus preparos. Havia aprendido com uma sabia mulher que não existia melhor cicatrizante e alivio para queimaduras.
As folhas eram de um verde pálido, com pequenos espinhos macios nas extremidades e quando cortadas deixavam sair um liquido gosmento e amarelado de cheiro forte.
Cortou uma pequena parte da folha e entrou na cozinha partindo a folha ao meio.
— Tire o pano – disse ele para o príncipe que olhava desconfiado para a folha que purgava a gosma.
— O que é isso? – perguntou ele tentando afastar a mão.
— Lingua de dragão! – Paul puxou o guardanapo e colocou a folha com a gosma em contado com a pele queimada fazendo o príncipe ter uma expressão de nojo – Deixe cinco minutos e pronto. Você não vai ter nem bolhas.
— Se eu não morrer envenenado antes – resmungava ele ante o cheiro forte da planta.
— Se fosse um desses emplastros nojentos que alguns mestres de cura fazem você não estaria reclamando! As pessoas deveriam olhar a natureza, ela é uma farmácia para tudo nessa vida.
Jared e Jason entraram correndo e rindo, enquanto Shon e Gabe vinha logo atrás. O primeiro estava com a cara amassada e pelo visto ainda com sono. Sem constrangimento nem um subiu em cima do colo de Mathew deitando a cabeça em seu peito e fechando os olhos.
— Shon! – Paul falou contrariado – Vá se sentar na cadeira!
— O Matt é gostoso de dormir – disse ele com a voz rouca.
Mathew riu segurando ele com a mão boa.
— Quando era da idade dele todo mundo tinha a mesma dificuldade de me tirar da cama, só depois que freqüentai a academia é que tive uma certa disciplina para acordar cedo.
— Shon desce – dessa vez o menino obedeceu fazendo um bico de um quilometro e todos puderam se servir.
Mathew nunca fora exigente com a comida, para ele estando cozida era o que bastava, mas ele não pode deixar de se deliciar com as panquecas com manteiga e mel, os pães fresquinhos e o café adoçado com o caríssimo açúcar branco dos reinos do sul.
— Eu não consegui resistir – ele disse para Mathew – Quando vi o açúcar e percebi que ele não ia alterar o gosto do café como o mel, eu economizei três meses para comprar um quilo.
— Pelo visto você é viciado em café!
— Achou meu ponto fraco – ele piscou um olho – Eu não consigo viver sem um pouco de café de manhã. Sei que a maioria só toma chá e acha café a bebida dos bárbaros do sul, mas se eles inventaram algo tão maravilhoso não devem ser tão bárbaros assim.
Eles caíram na risada e logo as crianças se juntaram a eles iluminando cada canto da casa que se enchia gradativamente com a luz do sol nascente com o som das risadas.
Sara parou de rir e virou a cabeça de lado.
— Dez cavaleiros, estão a galope, seus cavalos estão cansados – pausa – Todos tem espadas e armaduras.
— Onde Sara? – perguntou Paul preocupado.
— Quinhentos metros. Tudo bem mãe, são cavaleiros do reino.
— Como?... – Mathew estava decididamente pasmo.
— Posso ouvir até o mais pequeno som há quase um quilometro – disse ela com orgulho – Sei separá-los e classifica-los
— Como você pode ter certeza que são cavaleiros do reino?
— Normalmente por cauda das armaduras, mas agora por causa do barulho que estão fazendo. Nem um assaltante com um pouco que cérebro faria tal estardalhaço. Logo, logo vocês vão ouvi-los.
Não deu outra, alguns minutos depois ouviram patas de cavalo batendo no solo e alguém chamando Paul. O rapaz se levantou indo até a porta onde deu com dez cavalos negros e ofegantes com seus cavaleiros não mais ofegantes e com olheiras. A frente do grupo ia ninguém menos que o príncipe Phillip.
— Meu senhor – Paul fez uma reverencia completa para o senhor das terras de Haven.
— Paul eu precis... – nesse momento o príncipe viu Mathew que sorria amarelo da porta da casa.
— Mathew!! – ele desmontou em rapidamente – Estive ti procurando durante toda a noite! Droga eu morri de preocupação!
— Phillip me desculpe, a tempestade me pegou aqui eu não tive como voltar.
— Você saiu sem avisar ninguém para onde ia! Isso é muito perigoso!
— Foi uma coisa de momento...
— Nós vamos conversar no castelo!
— Meu senhor – Paul se inclinou uma segunda vez – O príncipe Mathew me ajudou na floresta e por isso ficou preso aqui na minha casa. Peço desculpas pelo transtorno.
— Esta tudo bem? – Phillip perguntou com a cara menos carrancuda.
— Eu torci o tornozelo e se sua alteza não estivesse por perto poderia ter tido problemas para voltar para casa.
— Que bom que meu irmão pode ajuda-lo Paul. Eu realmente me assustei ao ver que ele não aparecia.
— E resolveu sair debaixo de uma tempestade!
— O que você queria que eu fizesse irmão ingrato? Ficasse tomando vinho enquanto você estava por ai?
— Meu senhor – Paul chamou a atenção dos dois delicadamente tentando evitar uma briga na frente dos seus filhos – Vejo que estão todos cansados da noite insone, eu gostaria de oferecer um café da manhã ao senhor e seus homens para que possam se revigorar.
Os homens pareciam aliviados, mas o príncipe balançou a cabeça.
— Muito obrigado Paul, mas eu deixei Gwen no castelo sem noticias e ela deve estar preocupada – voltou-se para o irmão – Vamos?
— Vou buscar Linth – disse Mathew se virando a lançando um olhar agradecido para Paul.
— Eu ajudo! – disse Gabe indo atrás dele.
Essa foi a deixa para os outros garotos saírem da casa e fazerem reverencias para o príncipe e olhar para os cavaleiros ainda montados.
— Ola crianças! – disse Phillip sorrindo.
— Sua cavalaria faz muito barulho – disse Sara – Pude ouvi-los a meio quilometro.
— Sara! – Paul ficou vermelho.
— Já ouvi falar do seu ouvido Sara e garanto que muito poucas pessoas no mundo consegue ouvir algo de tão longe.
— Mas eu acho que eles existem, não é? Imagino que numa guerra passar despercebido seja muito importante. As pessoas não se dão conta do barulho que fazem até mesmo ao deslocar o ar.
Phillip estava mudo com a presença de espírito daquela menina e Paul sem fala de embaraço.
— Sabe Sara, isso é ensinado na academia da cavalaria de Gaulesh. Fico impressionado que você saiba.
— Eu escuto muito no mercado – ela deu de ombros – Mesmo cochichos são audíveis para mim – ela deu um sorriso coquete – Se você quiser guardar um segredo não o murmure a cem metros de mim.
O príncipe caiu na risada ante aquela menina atrevida e inteligente.
— Paul sua menina é incrível! – Phillip deu tapinhas na cabeça dele – Você e Gwen iam fazer um par de doer. Na verdade eu tenho uma proposta – virou-se para Paul – Que tal se você e sua família viessem para um jantar no castelo neste sábado? Tenho certeza que a minha esposa iria querer agradecer por ter acolhido Mathew.
— Obrigado meu príncipe – disse Paul com delicadeza, mas firme – Mas infelizmente não vai ser possível.
Phillip queria insistir, mas viu a determinação no rosto do outro.
— Tudo bem então.
Mathew estava terminando de selar seu cavalo e Gabe estava um pouco triste perto dele.
— Você vai mesmo vir nos visitar?
— Claro, eu dei a minha palavra. Virei assim que puder fugir do meu irmão.
— Se você quiser podemos ir pescar quando vier – o menino não olhava para ele. tinha a cabeça baixa e mecha em uma palha no chão com o pé.
— Que tal amanhã? Acho que hoje Phillip ia me matar se desaparecesse.
— Mesmo? – Gabe sorriu para ele – Eu vou ficar ti esperando.
— E eu virei, juro – ele bateu no ombro dele e foram juntos para a frente da casa onde Phillip já estava montado e esperando.
— Obrigado por tudo Paul – Mathew segurou a mão dele e deu um leve beijo sem tirar os olhos do rapaz vermelho.
Beijou o rosto de Sara e abraçou Jared e Jason. Olhou em volta a procura de Shon, mas o menino não apareceu.
— Ele não gosta de despedidas – disse Paul.
— De tchau a ele por mim – montou e acenou mais uma vez para a família acompanhando o irmão, mas querendo ficar ali.
vc mais uma vez me deixou emocionada com sua historia,ainda não li mas lerei mais tarde antes de dormir, para que ela embale meu sono, obrigada de novo.
ResponderExcluirbjs lu
Linda história!!
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